UM BEIJO DE BOA NOITE



Quando Kate e Chris ficaram muito idosos e necessitaram de cuidados especiais, foram recolhidos a um asilo onde Jane era enfermeira.
Muitas vezes, flagravam o casal admirando seus álbuns de fotografias. Kate mostrava, com orgulho, retratos antigos em que Chris aparecia loiro, alto e alinhado. E ela aparecia morena, sorridente e formosa.
Era lindo vê-los juntos, ainda namorados, lembrando alegremente a sua história. Passeavam de mãos dadas pelos corredores do asilo e as enfermeiras comentavam o que seria de qualquer um deles, quando o outro partisse.
Chris tinha um carinho especial com a esposa. À hora de dormir, ele a ajudava passar da cadeira para a cama e ajeitava as cobertas ao redor de seu corpo frágil. Em seguida, desligava a luz, se curvava delicada e a beijava, acariciando-lhe o rosto. Ambos sorriam.
Depois desse ritual amoroso, ele se dirigia para sua cama, no outro extremo do quarto (uma regra do asilo que os desagradava). Quanto apreciariam dormirem na mesma cama - um costume que os confortara a vida toda.
Um dia, Chris não despertou, vitimado por um ataque cardíaco no meio da noite. Toda a enfermagem redobrou cuidados com Kate. A pobrezinha parecia confusa e perdida. Ficava longo tempo com o olhar parado, fitando o nada. Tomava os álbuns e ficava acariciando as fotos do amado.
A pior parte do dia era a hora de dormir. Kate pedira para ficar na cama do marido. No entanto, tinha dificuldade para conciliar o sono.
Certa noite, Jane teve uma ideia. Após posicionar a paciente na cama, acariciou seu rosto e, debruçando-se, a beijou, dizendo: 
- Boa noite, querida.
Foi como se uma comporta se abrisse. Kate desatou a chorar.
- Chris sempre me dava um beijo de boa noite. Sinto tanta falta dele e de seu beijo na hora de dormir!
E, enquanto a enfermeira lhe enxugava as lágrimas, Kate continuou:
- Sem o beijo dele parece que não estou indo dormir. Muito obrigada por me dar um beijo, querida. Sabe... Chris costumava cantar para mim. Fico deitada pensando nisso... na canção que ele sussurrava aos meus ouvidos.
- E como era? - indagou Jane.
Kate sorriu, segurou a mão da enfermeira, limpou a garganta. Com voz fraca, mas ainda melodiosa, cantou: 
"Me beije, meu amor, e então nos separaremos. E quando eu estiver muito velha para sonhar, este beijo estará bem vivo no meu coração..."
Os anos podem tornar os cabelos grisalhos e transformar jovens ligeiros em idosos lentos. Mas o que melhor fazem os anos é tornar o amor maduro, duradouro e profundo.

Texto de Phyllis Volkens - adaptação de Marcos Aguiar. 

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