O IMPRUDENTE





Duarte Nunes era um homem muito rico. Dono do próprio tempo, não sabia usá-lo de maneira nobre, desperdiçando-o em alucinantes e precipitadas emoções - corridas de carros e de cavalos, concursos de lanchas e esportes radicais. 
Apesar de gastador, procurava ser bom esposo e bom pai. De vez em quando levava a esposa e os filhos pequenos para passear.
A mulher, sempre atenta ao velocímetro, rogava:
- Amor, mais devagar!
Ele porém, sorrindo com sarcasmo, pisava mais fundo.
Outras vezes, era o amigo Bruno que o advertia quando o carro de luxo parecia comer a pista:
- Não corra tanto assim... olhe os pedestres!
- Que tenho eu com isso?
- Há pessoas distraídas e crianças ingênuas. Nem sempre conseguem prestar atenção de imediato...
- Rodas foram feitas pra rodar, e depressa - debochava Nunes.
Até o pai o aconselhava:
- Filho, é preciso prudência... o volante pede calma... o excesso de velocidade é a rota para o desastre...
- Bobagem, pai.
Ou seja, sempre que era chamado à atenção, Nunes acelerava ainda mais.
Numa manhã de domingo, a mãe de Nunes resolveu levar os netinhos para um passeio na praia de Ipanema. Nunes, após deixá-los na casa da avó, que ficava a alguns metros da praia, dirigiu-se para Petrópolis na companhia de Bruno, onde passaram o dia num confortável hotel serrano.
À tardinha, regressaram. Raios crepusculares davam à cidade maravilhosa um imponente aspecto dourado.
Nunes sugeriu:
- Que tal pararmos em Copacabana pra uma cerveja gelada?
A essa altura, o carro devorava o asfalto.
- Devagar, Nunes, devagar... 
Pararam, tomaram um chop, pegando a estrada logo depois. Nunes decolou com o carro, a todo vapor.
- Devagar, cara - balbuciou Bruno.
Nunes sorriu e se fez de surdo.
Repentinamente, antes de Nunes conseguir brecar, o carro atingiu em cheio um pequeno em trajes de banho que tentava alcançar o outro lado da avenida. 
Tarde demais. O menino tombou como um saco de cimento. Populares gritando. O pobrezinho agonizando.
Bruno saiu do carro sobressaltado e ergueu a criança. Nunes gritou:
- Seja quem for, leve ao pronto-socorro... pago todas as despesas... nem quero olhar...
Bruno chegou mais perto, com o menino já morto.
- Nunes, este menino é...
- É quem? Diga logo! - berrou o outro, impaciente.
- É seu filho...

Autoria desconhecida - adaptação de Marcos Aguiar. 

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