AUTOACEITAÇÃO





Era uma mulher linda, mas infeliz. Seu maior pavor era perder o que considerava inigualável: sua beleza.
Atormentava-se desde muito jovem, mirando-se no espelho com frequência, procurando um mínimo defeito na pele lisa.
Com o tempo, chegaram pequenas rugas e manchas. Fios de cabelo branco foram surgindo, cobrando-lhe cuidados constantes a fim de escondê-los.
Quando alcançou os sessenta anos, a mulher se tornara uma resmungona; odiava o fato de estar envelhecendo, apesar de ouvir dos outros que aparentava ser bem mais jovem. Era verdade, mas ela simplesmente não acreditava.
Um amigo lhe sugeriu:
- Tente pensar que você está conquistando a maturidade e não perdendo a juventude!
Argumentação inútil. Não parecia natural para ela.
Decidiu recorrer à plástica. 
As primeiras cirurgias lhe fizeram muito bem. Removeram-lhe traços indelicados e sinais de cansaço prematuro.
Posteriormente, o médico a advertiu para que desse um tempo para novas intervenções. Seria prudente dar descanso ao corpo. Mas a mulher não quis ouvir. Buscou outros profissionais que fizeram suas vontades, sem restrições. 
O problema era que nenhum procedimento cirúrgico supria-lhe amor próprio; continuava detestando o preciso diagnóstico do espelho. Recorreu ao isolamento, afastando-se de amizades, eventos e festas.
Quando se permitia sair a algum lugar, parecia-lhe que todos a apontavam, dizendo:
- Lá vai aquela velha!
Ela desejava reaver o rosto dos seus brilhantes dezoito anos, mas as tantas cirurgias a que se submeteu não puderam fazer esse milagre. Apenas a transfiguraram. Mudaram-lhe os contornos dos olhos, o nariz, o queixo, as orelhas. Nada mais nela era dela. Tornara-se irreconhecível. 
E, contudo, continuava infeliz. Esquecera de viver cada dia, com a intensidade que a vida lhe oferecia.
Envelhecer é natural, mas não é sinônimo de decadência física. Representa, sim, o acumular de experiências. O corpo pode não se valer da mesma força dos verdes anos, mas o espírito pode conservar o vigor de sempre. Que a mente se mantenha sempre jovem.

Texto de Lya Luft - adaptação de Marcos Aguiar. 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

UMA FILA QUE VALEU A PENA

A VERDADEIRA RIQUEZA

OS PREGOS