O PREÇO DA TAGARELICE

Houve um tempo em que não existiam redes de dormir. As pessoas dormiam no chão por cima de folhas ou pendurados em árvores, como macacos. Mas Tamaquaré, o feiticeiro de uma grande tribo, cansara-se desse hábito.

Ele estava para casar-se e não queria mais dormir no chão como os outros; receava que algum animal machucasse a ele e à sua amada. Também não queria dormir no alto das árvores porque tinha medo de cair de lá com sua mulher.

Então ele resolveu conversar com o tucano sobre essa questão. O tucano nessa época tinha o bico curto e falava pelos cotovelos. 

- Pode me ajudar a resolver esse problema? - indagou Tamaquaré.

O tucano, depois de muito pensar, teve uma ideia: pegou um monte de cipós e começou a trançá-los. Depois amarrou o trançado entre duas árvores e chamou o pajé, que ficou muito satisfeito, mas ao mesmo tempo o advertiu:

- Gostei muito do seu trabalho, mas não quero que os outros saibam como consegui isso. Entendeu? Não conte a ninguém, se não vou me zangar com você!

O pássaro prometeu ficar em silêncio. 

No dia do casamento de Tamaquaré, fizeram uma festa de arromba. O tucano ficou tão animado que bebeu até ficar completamente ébrio e se pôs a tagarelar. De repente, no meio de todos, ele gritou:

- O pajé tirou a sorte grande! Além de se casar com uma bela mulher, nunca mais vai dormir no chão, mas na rede que eu fiz! Vai dormir bem confortável!

E exibiu a rede, deixando a tribo inteira encantada. Mas Tamaquaré se aborreceu: cuspiu no chão com raiva e, pegando o tucano pelo bico, começou a puxá-lo com muita força e disse:

- Agora você vai ficar com esse bico enorme como castigo por sua língua comprida. Nunca mais irá falar e nem alçar voos prolongados.

A partir de então, todos passaram a usar redes para dormir, já que não era mais um segredo. E o tucano, coitado, passou a exibir aquele bicão, resmungando um "nhé-nhé-nhé" e voando curtas distâncias.

Lenda indígena - adaptação de Marcos Aguiar.