FRUTO DANINHO




Um corvo apanhou uma noz e a carregou ao topo de um campanário (a torre de sinos de uma igreja). Segurando-a com as garras, começou a bicá-la a fim de abri-la. Porém, subitamente, a noz escapuliu e rolou para baixo, desaparecendo numa brecha do muro.
Percebendo estar livre do corvo, a noz comentou com o muro:
- Meu amigo muro! Que bom que vim parar aqui! Minhas preces foram ouvidas! Meu destino era cair entre os velhos ramos da minha mãe e permanecer no rico solo coberto de folhas amarelas. Mas quando vi que estava sendo atacada por aquele corvo feroz, fiz um voto: prometi que, se escapasse, passaria o resto de minha vida dentro de uma fresta; e foi o que aconteceu. Por favor, mantenha-me aqui!
Nesse ponto os sinos começaram a badalar. Advertiram o muro sobre o perigo de manter um fruto em seu seio. Afinal, era um corpo estranho que poderia posteriormente causar-lhe problemas. O muro, entretanto, não viu nada de mais em dar abrigo à pobre noz.
O tempo passou e a natureza fez o seu trabalho. A noz começou a abrir, estendendo pouco a pouco suas ramificações ao longo do muro. Não muito depois, as raízes, cada vez mais espessas, forçaram caminho por entre os blocos de pedra e surgiram galhos que saíram pela fresta.
Os galhos cresceram, tornaram-se mais fortes e procuraram as alturas, competindo com o campanário. Lá embaixo, as grossas e enroscadas raízes começaram a fazer buracos no muro, tomando o lugar das pedras.
O muro suspirava, mas nada podia fazer. Era tarde demais. Deveria ter ouvido o conselho dos sinos. Só agora entendia que a humildade da noz era puro fingimento.
Ao final da metamorfose, uma enorme nogueira ocupou o lugar do antigo muro, que acabou por desmoronar.
Coisas aparentemente insignificantes como fofoca, ciúme, irritação e ressentimento podem criar raízes em teu coração e causar grandes estragos. Abra os olhos para não ser prejudicado.

Fábula de Leonardo da Vinci (1452-1519) - adaptação de Marcos Aguiar. 

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