NOTADO OU IGNORADO?




"Não gosto que fiquem olhando pra mim", dizia um peixinho que morava no aquário de uma rica casa da capital.
Seu viveiro consistia num grande globo de vidro enfeitado com algas e ficava num lugar de destaque na sala de visitas, de maneira que todos que iam àquela casa sempre paravam para admirar o peixinho tão dinâmico e feliz - do ponto de vista deles, porque o peixe vivia mesmo era agitado e com raiva de ser tão observado.
"Detesto que me observem!", repetia ele de si para si. "Tenho certeza de que se essas pessoas estivessem no meu lugar, também se sentiriam incomodadas com tantos olhares!"
O peixinho tentava se esconder por trás de algas ou pedras, mas sem muito êxito: a cauda ou a cabeça acabavam sempre ficando de fora.
Sua dona, uma idosa muito simpática, cuidava dele com todo o desvelo. Ela era a única pessoa que ele tolerava.
Mas um dia aquela senhora adoeceu gravemente e morreu. O velório foi realizado em sua casa e, como era uma pessoa muito conhecida e estimada, o recinto ficou cheio.
Em meio aos abraços e condolências, quase ninguém deixava de reparar no aquário e no seu ocupante.
"E esse povo, sempre reparando em mim! Parece que eles não têm outra coisa pra fazer! Que saco!", resmungava.
A cerimônia fúnebre terminou, o caixão foi levado para fora e todos se retiraram. Na sala, agora vazia e com as cortinas descidas, reinava paz. O peixe suspirou aliviado, pois não havia mais ninguém ali para importuná-lo com olhares indiscretos.
Entretanto, algum tempo depois, vieram uns parentes da falecida para reorganizar os móveis da casa.
- Quem vai ficar com o peixe do aquário? - indagou um deles.
Ninguém queria.
- Vamos colocar o peixe lá no tanque do quintal - sugeriu outro parente; os demais concordaram.
Assim o peixinho acabou indo para o tanque, nos fundos do quintal. O tanque era um pouco fundo e mal cuidado, mas pelo menos agora ele podia nadar à vontade, em meio ao lodo e às sombras, sem ser incomodado.
Mas foi aí, na completa solidão, que o peixe começou a sentir saudades do tempo em que todos o notavam. Era, porém, tarde; estava fadado a terminar seus dias completamente sozinho, num tanque sujo e de água barrenta.
A grande verdade é que, inconscientemente, todos ansiamos por atenção, reconhecimento e aceitação, mesmo que às vezes não gostemos de admitir isso abertamente. 

Autoria desconhecida - adaptação de Marcos Aguiar. 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

UMA FILA QUE VALEU A PENA

A VERDADEIRA RIQUEZA

OS PREGOS