AS DUAS MÃES DE PAULA




"Neide tinha apenas 14 anos quando resolveu deixar a roça e tentar a vida na cidade grande.
Chegando ao Rio de Janeiro, sem qualificação profissional alguma, enfrentou dificuldades para encontrar trabalho. Finalmente, minha avó a admitiu em sua casa e a ensinou a cozinhar e faxinar. Uns anos depois, quando eu tinha somente 3 meses de vida, Neide veio morar conosco e se tornou minha babá.
Mais uns anos se passaram e nasceram meus irmãos. Outras babás chegaram e foram embora e Neide permaneceu, ajudando a cuidar de três crianças com pouco mais de um ano de diferença entre si.
O que é uma babá? É alguém que é paga para trocar fraldas, levar as crianças à pracinha, brincar com elas e pô-las pra dormir. Pois é; acho que Neide nunca foi minha babá.
Não que ela não tenha feito tudo isso; a questão é que nunca o fez meramente como babá.
Neide me ensinou, por exemplo, a fazer conta de dividir. E, no ano seguinte, ao meu irmão. E, depois, à minha irmã.
Veja que coisa: três filhos de um economista e uma advogada com pós-graduação na Alemanha, estudando num dos melhores colégios da cidade, mas que só aprenderam a fazer conta com aquela outra mãe, oriunda do interior e que não tinha nem o segundo grau completo.
Por vezes, minha mãe tentou convencer Neide a voltar a estudar. Quis que ela aprendesse a dirigir e até lhe ofereceu um carro de presente. Ela, contudo, recusou.
Lembro que, na época, me revoltava com a inércia de Neide. Queria que ela evoluísse. Até então eu ainda não compreendia que ela desempenhava com esmero a 'profissão' que tinha escolhido abraçar: ser nossa mãe.
Os anos passaram e nós crescemos. Um dia, chegou uma notícia triste. O pai de Neide, diabético, precisou amputar parte da perna. A mãe dela, já idosa, não tinha condições de cuidar do marido sozinha.
Foi assim que, aos 17 anos, tive de dizer adeus à minha segunda mãe que, após quase 30 anos na cidade, vivendo no seio de minha família, precisou retornar à roça.
Neide nunca teve filhos biológicos, mas seria uma incoerência dizer que ela não foi mãe. Ela foi a melhor mãe que uma criança pode ter e eu fui a criança mais feliz do mundo por ter sido criada não por uma, mas por duas mães maravilhosas."
A vida, às vezes, nos presenteia com verdadeiros "anjos sem asas" que acabam se tornando tão ou mais chegados a nós que alguém da família!

Texto de Paula Foschia - adaptação de Marcos Aguiar. 

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