QUANDO SE ABRE A BOCA DEMAIS...




Uma tartaruga convivia com dois patos num pequeno lago e eram muito amigos. Só que a tartaruga era um tanto tagarela: adorava conversar até cansar, de maneira que os patos quase não conseguiam falar.
Algum tempo depois, uma seca prolongada acabou esvaziando o lago. Os patos viram que não podiam continuar morando ali e resolveram voar para outra região, mas não sem antes se despedirem da amiga.
- Oh, não! Não me deixem! - suplicou a tartaruga - Levem-me com vocês, senão eu morro!  
- Mas você não sabe voar! Como é que poderíamos levá-la?  
- Mas eu quero ir com vocês! - insistiu.
- Bom... acho que tem um jeito - disse um dos patos - É o seguinte: cada um de nós vai morder a extremidade de uma vara e você morde no meio. Assim poderemos te carregar. Mas lembre-se de não abrir a boca enquanto estivermos lá em cima!
- Podem deixar! Nem vou mexer a boca! - prometeu alegremente a tartaruga. 
Então assim fizeram. A tartaruga era um pouco pesada, mas seus amigos a carregaram de boa vontade, num voo suave.
Quando passaram por cima da floresta, a tartaruga pensou em dizer: "Que vista!" Mas logo se lembrou da promessa e se conteve.
Ao sobrevoarem a cidade, a tartaruga quis perguntar: "Que movimento é aquele lá embaixo?" Mas lembrou-se da promessa novamente. 
Foi então que alguns transeuntes, olhando para o alto, exclamaram asombrados:
- Olhem aquilo! Dois patos carregando uma tartaruga!
- Que engraçado!
- Não deixa de ser esquisito!
- Por que será que os patos estão fazendo isso?
- Que tartaruga folgada!
- Já viram coisa mais ridícula?
E começaram a dar risada.
A tartaruga foi ficando zangada com aquilo e perdeu a paciência. 
- Calem a boca, imbecis! - gritou.
Tarde demais para abocanhar a vara. Era uma vez uma tartaruga tagarela. 
Há momentos em que ficar calado é a melhor coisa a se fazer!

Texto de Millôr Fernandes - adaptação de Marcos Aguiar. 

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