O "ÚNICO NETO"




Uma senhora setentona chegou ao consultório sozinha. Ainda estava em pleno vigor, apesar de já ter a aparência naturalmente isenta do frescor da juventude; em seu lugar, apresentava um olhar apagado e quase sem brilho.
O médico não deixou de notar a melancolia de sua paciente e quis saber o que a deixava assim.
-  Até parece que a senhora perdeu o prazer pela vida - comentou.
Ela então confidenciou:
"Bom, doutor, eu sou viúva já há alguns anos e moro só. Tive cinco filhos. Todos passaram pela universidade e exercem profissões com carreiras exitosas.
Quatro deles casaram e tiveram filhos. A mais nova, porém, deu prioridade aos seus sonhos acadêmicos e hoje mora num pequeno apartamento e tem um cão por companheiro - que, aliás, é tratado por ela como uma criança. Toda noite, ansioso, ele fica à porta, esperando a dona chegar. Abraçam-se, brincam e fazem juntos as refeições. 
A princípio eu estranhava essa relação; mas com o tempo mudei de ideia, e explico por quê. 
Como já disse, meus filhos casados me deram netos e costumo visitá-los nos finais de semana ou feriados, quando sei que estão em casa.
Quando chego, vou logo anunciando: 'Vovó chegou! Oi, criançada!'
Só que nenhum deles vem ao meu encontro. Se estão em frente à TV, não param de assistir e se estão com o celular, não tiram os olhos dele. É como se eu não existisse. E é sempre assim. Dói na alma, doutor. Nenhum sorriso e nenhum abraço, não importa quanto tempo eu me demore na casa deles. 
Mas quando vou à casa da minha caçula, basta que eu ponha os pés no assoalho que o cão corre ao meu encontro. Ele salta alegremente e me envolve as pernas com suas patas, à semelhança de um abraço. Quando sento-me à mesa com minha filha, ele deita aos meus pés e permanece ali, o tempo todo - de vez em quando, roçando as patas em mim, como quem diz: 'Oi, estou aqui!'
Até parece, doutor, que o cachorro é o meu único neto. Dá pra acreditar numa coisas dessas?"
Toda pessoa deseja atenção, carinho e amor. O fato é que nenhuma tecnologia substitui um olhar de ternura, uma carícia ou um abraço envolvente.
Não podemos esquecer que somos gente. E gente precisa de gente. O calor humano não pode ser suprimido em nome da tecnologia, por mais fascinante que ela seja.

Autoria desconhecida - adaptação de Marcos Aguiar. 

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