DESPEDIDA DE UM VERDADEIRO AMOR




Estavam casados há dezenove anos e tinham um filho.
Numa manhã de primavera, o marido pediu o divórcio. Confessou já ter outra mulher com quem combinava melhor e desejava viver.
Ao ver a esposa chocada, contava com um escândalo; mas em vez disso ela simplesmente lhe pediu para aguardar trinta dias, antes que se separassem de vez. E completou:
- Como condição para você me deixar definitivamente, peço que, durante estes trinta dias, a cada manhã, você me carregue nos braços, do quarto para a sala de jantar.
"Bom, o que são trinta dias para quem estará livre depois?", pensou ele. 
- Está bem. De acordo - respondeu.
Assim, no dia seguinte, ele a carregou para a sala de jantar e saiu para o trabalho. Quando retornou à noite, ela estava sentada à mesa, escrevendo. O mesmo se sucedeu nos dias seguintes.
No vigésimo-primeiro dia, enquanto a carregava, ela recostou a cabeça no ombro dele. O delicado gesto o fez recordar dos primeiros dias de casado. Por um momento foi envolvido por um doce enlevo, mas logo lembrou do acordo.
No vigésimo-quinto dia, quando ele a carregava, o filho os surpreendeu. Olhando para eles, sorriu e comentou:
- Olha o casalzinho namorando... Legal, hein, pai?
Aquilo mexeu com ele. Faltavam somente cinco dias para sua liberdade, mas ele começara a sentir algo estranho por dentro. Já não tinha tanta certeza se desejava mesmo ficar com a amante. Na tela do seu pensamento, começou a rever o filme há muito esquecido de sua vida amorosa com a mãe de seu filho. 
Inconscientemente, passou a se dar conta de que a esposa estava mais leve a cada dia. Presumiu que era apenas uma impressão tola. Devia ser o costume de carregá-la toda manhã.
Ao chegar o último dia do trato, o homem estava decidido. Iria terminar com a outra. Ela ficou muito zangada, xingou a esposa dele e o mandou embora. 
Na volta, comprou flores para a esposa. Chegou em casa cantarolando. Esperava encontrar a mulher sentada à mesa como nos dias anteriores, mas ela não estava lá. Então foi ao quarto.
Ela estava na cama, deitada e com os olhos fechados.
Ele se aproximou e curvou-se para beijá-la. Imediatamente sentiu um calafrio ao sentir a pele rígida da esposa. Ela estava morta.
Sobre a mesa de cabeceira, havia um envelope com o nome dele. Verificou que era uma carta longa; era aquela que ele a vira escrever, dia após dia.
Leu, entre lágrimas, que, no dia em que ele lhe pedira o divórcio, ela havia se preparado para lhe contar sobre o diagnóstico que recebera, de que teria somente trinta dias de vida. Por isso, para que ele não se sentisse culpado e ficasse verdadeiramente livre, ela lhe pedira aquele prazo, para ficar em seus braços pela última vez.
Agora, ele estava livre para buscar o amor que desejava.
O viúvo chorou copiosamente. Havia perdido o seu verdadeiro amor. Um amor que, mesmo não mais sendo correspondido, pensara nele e na sua felicidade.
Enquanto ainda há tempo, valorize quem te ama.

 Texto de Divaldo Pereira Franco - adaptação de Marcos Aguiar. 

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