UMA NOVA VISÃO




O pintor e documentarista francês Hugues de Montalembert (1943-) teve uma mudança drástica em sua vida em 1978, aos trinta e cinco anos, durante um assalto em Nova York, quando perdeu a visão.
Após a tragédia, ele teve que se adaptar a outra realidade. Em seu mundo, antes banhado pelas cores e pela luz, predominavam agora as trevas.
Ele que, em sua profissão, captava tudo através dos olhos, fotografando paisagens e pintando telas, encontrava-se agora numa condição abstrata, composta basicamente por sons. Contudo, Hugues não se deixou abater por isso. Descobriu que a saída estava dentro dele mesmo.
Com o objetivo de reconquistar sua independência e total liberdade, iniciou um processo contínuo de autossuperação. 
O primeiro obstáculo foi vencido quando aprendeu a caminhar pelas ruas munido apenas da bengala. Depois empreendeu viagens solitárias a lugares distantes como Indonésia, Groenlândia e Himalaia, desenvolvendo uma impressionante habilidade de explorar sem enxergar.
Hugues compreendeu que o medo é o principal inimigo dos cegos. Assim, resolutamente, continuou mantendo a paixão pela vida.
Uma grande descoberta que fez foi quando identificou que a luz é capaz de tornar muitas coisas invisíveis. Antes ele se ocupava tanto em olhar que deixava de perceber e sentir as pessoas; então passou a buscar o sentimento que elas transmitiam por meio da voz e do toque.
No constante duelo com a escuridão, entrou em contato com a sua essência, encontrando nela características que não teria identificado em outra situação.
Em suas novas aventuras pelo mundo, criou sua própria visão através da somatória de sons, movimentos e aromas que a natureza lhe fornecia. Aprendeu a criar imagens evocando a realidade que havia observado intensamente nos anos anteriores à sua cegueira, tornando-se capaz de descrever uma paisagem e reconhecer sua beleza, apenas com a percepção dos demais sentidos.
Assim como Hugues, todos temos a capacidade de enfrentar dificuldades e, com coragem, adaptar-se a novas situações, não se deixando aprisionar ao passado.
Que os olhos da nossa alma sejam capazes de enxergar dimensões infinitas, imperceptíveis à visão física e que não nos tornemos cegos para a beleza e poesia da vida.

Baseado no livro "Um Outro Olhar", de Hugues de Montalembert - adaptação de Marcos Aguiar.

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