DANDO O QUE SE TEM

Uma jornalista chinesa foi enviada a uma aldeia a fim de fazer uma matéria sobre os camponeses, sendo recebida por uma humilde família (uma mulher e três filhas) com a qual pernoitou.

Possuíam somente duas galinhas e todos os dias a mãe trocava dois ovos por um pouco de arroz, farinha, óleo e verduras. Era evidente que não tinham condições de alimentar um hóspede, de maneira que a jornalista preparou-se mentalmente para passar fome enquanto permanecesse na pequena moradia com paredes feitas de barro e teto forrado com palha.

A dona da casa lhe mostrou uma prancha de madeira - a cama que ela partilharia naquela noite com as meninas de sete, cinco e dois de idade.

As crianças ficaram empolgadas com a hóspede, abriam a bolsa dela, tiravam tudo de dentro e a crivavam de perguntas. 

Nisso a mãe gritou:

- Hora do jantar!

As meninas arrastaram a nova amiga até à cozinha, que se deixou conduzir um pouco sem jeito.

As pequenas deram gritinhos de alegria com o que viram; já a jornalista ficou perplexa: sobre a rústica mesa havia uma fumegante galinha assada.

- Por que você matou sua galinha? Por favor, não diga que foi por minha causa! - falou a hóspede com tristeza.

- É claro que foi por sua causa! Você veio de longe e está debaixo do nosso teto. É o melhor que temos pra lhe dar. Fique à vontade e coma - respondeu a dona da casa com uma naturalidade fria mas sincera. 

Comovida, a jornalista agradeceu e tomou parte na refeição. 

"Haveria em algum outro lugar do mundo alguém que oferecesse metade de seus bens a um convidado para um jantar?", ela pensou.

Saiu dali no dia seguinte revigorada com aquela experiência inesquecível.

Alguns anos depois ela retornou àquela aldeia e procurou a dita família, que havia enriquecido graças à nova política na China.

Elas a receberam mais uma vez, com euforia, oferecendo-lhe mais presentes: vinte galinhas e cem ovos.

Quem tem bom coração é generoso na abundância e na escassez; para ele não há diferença. 

Texto de Xinran - adaptação de Marcos Aguiar.