COM SENTIMENTOS NÃO SE BRINCA!




Dizem que os sentimentos, quando crianças, reuniram-se para brincar.
- Não suporto mais ficar à toa! - reclamou o Tédio.
Aí a Loucura propôs:
- Que tal brincarmos de esconce-esconde?
A Curiosidade, sem poder conter-se, perguntou:
- Esconde-esconde? Como é isso? 
- É assim: eu fecho os olhos e começo a contar de um a dez enquanto vocês se escondem; ao terminar a contagem, o primeiro que eu encontrar ocupará meu lugar para continuar a brincadeira - explicou a Loucura.
Ouvindo isso, Entusiasmo, Euforia e Alegria deram tantos pulinhos de contentamento que acabaram convencendo a Dúvida e a Preguiça a participarem da brincadeira. 
A Verdade, porém, preferiu não aderir. "Esconder-me pra que, se no final todos me encontram?", pensou.
A Soberba, ressentida por não ter sido sua aquela ideia, deu de ombros e disse:
- Isso é pra idiotas!
O Medo e a Covardia acharam melhor não se arriscar.
- Vamos lá, então! - gritou a Loucura - Um, dois, três...
A Pressa foi a primeira a esconder-se, mas logo tropeçou e se machucou. A Fé subiu ao céu e a Inveja se escondeu atrás do Sucesso que, com seu próprio esforço, conseguira alcançar a copa da árvore mais alta.
A Beleza encontrou esconderijo numa lagoa cristalina; a Liberdade se aventurou numa rajada de vento e foi longe; já a Timidez, acanhada, preferiu ocultar-se numa toca de tatu.
O Egoísmo reservara um local perfeito, somente pra ele, ao contrário da Generosidade, cujo esconderijo era espaçoso e à disposição de todos que quisessem se esconder ali.
A Mentira comentou com a Ingenuidade que iria se esconder no fundo do oceano, mas foi mesmo para trás do arco-íris; o Desejo se enfiou no centro de um vulcão.
O Amor encontrou um roseiral e, cuidadosamente, escondeu-se entre suas flores.
- Dez! - gritou a Loucura.
O coitado do Esquecimento foi o primeiro a ser achado, pois não lembrara estar na brincadeira. A Preguiça praticamente nem havia saído do lugar. A Dúvida foi outra que se deixou encontrar facilmente, pois ficara indecisa sobre onde esconder-se.
Não podendo mais ocultar-se, a Fé e a Esperança bradaram. Dentro do vulcão, o Desejo vibrou fortemente. A Inveja, por descuido, acabou sendo descoberta, mas o Sucesso falou mais alto. Nem se deram ao trabalho de procurar pelo Egoísmo, que permaneceu em torno do próprio umbigo.
De tanto procurar, a Loucura ficou com sede. Daí, ao aproximar-se da lagoa, encontrou a Beleza.
O Talento estava num campo aberto e a Angústia numa cova escura. Quando o arco-íris se dissipou, a Mentira já não estava lá; tinha mergulhado no fundo do oceano.
Quase desistindo de procurar pelo Amor, a Loucura se pôs a revolver um roseiral. Repentinamente ouviu-se um doloroso grito.
Os espinhos do roseiral tinham ferido os olhos do Amor.
A Loucura, desesperada, pediu perdão ao Amor.
Desde então é que se diz que "o Amor é cego e a Loucura sempre o acompanha".

Texto de Renato Antunes Oliveira - adaptação de Marcos Aguiar. 

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