A ÚLTIMA TAREFA

 





Julian jamais esqueceria aquela manhã de terça-feira. Acordou com sua mãe chamando-o. Ela estava no quarto da irmã mais velha dele, Sandra.
A mãe estava no quarto, sentada, quieta.
- Sua irmã morreu nesta manhã, Julian.
O conceito de morte não tinha um significado concreto para o garotinho de 4 anos. Durante muito tempo depois, ele perguntava à mãe:
- Mãe, Sandra vai voltar? Por que ela teve de morrer?
E ficava em frente à casa, esperando que o ônibus escolar a trouxesse de volta.
Entrava no quarto e conferia a mochila dela. Tudo em ordem - cadernos de um lado, livros do outro, o estojo de lápis no meio. Também estava ali a faixa elástica preta que ela usara nos cabelos quando foi ao colégio naquela última manhã.
Recolocava a mochila no lugar, receando talvez que a irmã ficasse zangada por ele ter mexido nas coisas dela.
Com o tempo, Julian finalmente compreendeu a real situação. Mas o que ele jamais esqueceria foi o que aconteceu duas noites antes da irmã morrer.
Ela voltou da escola preocupada. Não fizera um trabalho de arte que devia entregar no dia seguinte.
- Eu te ajudo, irmã, não se preocupe.
Naquela noite Sandra rabiscou doze borboletas de antenas compridas e asas triangulares. Julian fez a arte final e depois coloriu.
No dia em que ela morreu, ele estranhamente despertou mais cedo, a tempo de ver a irmã saindo para a escola.
Como o vão da escada no prédio estava um pouco escuro, ele ficou segurando a porta aberta a fim de que a luz do apartamento clareasse os degraus, para que Sandra descesse em segurança.
Estava de uniforme azul e tinha só 14 anos.
- Até mais tarde, Julian.
Passados mais de 40 anos, Julian ainda guarda a lembrança da irmã. Sempre que vê uma borboleta, no mesmo instante recorda daquela última tarefa escolar que fizeram juntos.
Ele ainda espera que, um dia, se reencontre com a amada irmã - em outra vida, quem sabe...

Texto de Michael Tan - adaptação de Marcos Aguiar.

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