TUDO NÃO

 




Um pescador e sua mulher viviam numa velha cabana à beira-mar. Todos os dias ele saía a pescar e era feliz nessa vida simples.
Numa manhã em que o mar estava relativamente calmo, lançou a rede e teve muita dificuldade em puxá-la. Achou que tivesse pegado um montão de peixes e puxou com toda a força. Mas o que conseguira pescar foi apenas um único peixe de escamas douradas. Qual não foi o espanto do homem quando, ao retirar da rede o peixe, este lhe falou com voz humana:
— Por favor, senhor, me deixe voltar para  a água e dar-te-ei o que quiseres.
O pescador resolveu soltar o peixe falante, e voltou para casa em seguida. Quando contou à mulher o sucedido, ela ficou muito zangada:
— Ao menos você poderia ter-lhe pedido pão! Você sabe que estamos há dias sem comida. Volte lá e peça isso ao peixe.
O pescador voltou ao lugar onde tinha largado o peixe. 
— Peixinho dourado, vem cá! - gritou.
Para surpresa dele, o mesmo peixe falante apareceu.
— O que desejas? - disse.
— Minha mulher acha que eu deveria ter-te pedido comida. Podes atender-nos?
— Volte para casa — respondeu-lhe o peixe. — Assim será feito!
Ao chegar em casa, o pescador encontrou a mulher ocupada, empilhando sacos de pão e de farinha a um canto da cabana, feliz da vida.
Passado um mês, porém, a mulher começou a queixar-se.
— Você devia era ter pedido uma casa. Olhe para nossa cabana miserável! O que nos faz falta, na verdade, é uma boa casa. Volte lá e peça isso ao peixe.
O homem voltou para falar com o peixe. O sol desaparecera por detrás das nuvens e um vento moderado soprava.
— Peixe!
— E agora? O que você quer?
— Quero uma casa. Minha esposa e eu estamos cansados da nossa cabana velha.
— Volte. Assim será feito.
Ao voltar o homem encontrou a mulher com um vestido novo, na soleira de uma grande casa de pedra, no lugar da antiga cabana. 
— Veja só — disse-lhe a mulher, sorrindo — fiz bem em mandar você pedir isto!
Mas, duas semanas depois, a mulher do pescador voltou a reclamar:
— Esta casa é muito pequena, marido. Precisamos de uma maior. Vá de novo falar com teu peixe e lhe peça um castelo!
A mulher insistiu tanto que o homem não teve escolha; foi de novo.
— E agora, o que quer desta vez? - indagou o peixe.
— Queremos agora um castelo. Minha mulher acha a casa pequena demais.
— Está bem, volte. Será feito.
Na volta, o pescador viu a mulher magnificamente vestida, no pátio de um grande castelo, rodeado por um belo parque. Numerosos criados atarefados andavam pra lá e pra cá. A mulher, claro, estava radiante.
Ao final daquela mesma semana, a mulher acordou o marido resmungando:
— Temos que ser os soberanos desta terra. Vá até o peixe e diga-lhe que nos faça rei e rainha.
— Mas eu não quero ser rei! — retrucou o homem.
— Mas eu quero ser rainha! Vá e diga ao peixe que quero governar o país.
Triste e com o coração pesado, o pescador foi conversar com o peixe encantado. Pediu que tornasse rainha a esposa dele.
— Está bem; assim será! - declarou o peixe.
Na volta o homem encontrou um palácio ainda mais esplêndido, protegido por incontáveis soldados. Sua mulher estava sentada num magnífico trono, coroada e com um suntuoso vestido. Estava exuberante e cheia de si.
No entanto, nessa mesma noite, a rainha não conseguiu dormir. Passou a noite em claro, pensando o que mais poderia obter do peixe. Quando o sol surgiu e iluminou o quarto, ela gritou enraivecida:
— Como é possível? Quando quero dormir é que o sol se levanta, e sem a minha autorização. Marido, vá e fale com o peixe. Diga-lhe que desejo que os astros me obedeçam.
Pesaroso, o pescador voltou ao mar.
— Peixe! Vem cá!
Demorou um pouco, mas o peixe apareceu como sempre.
— Caramba, o que mais tua mulher pode ainda querer?
— Ela quer reinar sobre o Universo inteiro!
— Amigo, tua mulher nunca se sentirá satisfeita. Pra mim chega. Adeus. Nunca mais voltaremos a nos ver.
Ao retornar, o homem constatou que o palácio tinha desaparecido e que, em seu lugar, estava  a humilde cabana de outrora. A mulher choramingava, envergando seu velho vestido remendado.
— Não chore, mulher — disse o marido, abraçando-a — Não eras mais feliz quando rainha. A felicidade consiste em estar contente com o que se tem.
E partiu, feliz, para pescar o alimento de todos os dias no mar límpido e tranquilo.
(adaptado)

Quem tudo quer, pode acabar perdendo tudo.


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